sábado, 25 de julho de 2009

No Olho da Rua


No começo dos anos 80, peguei meu acordeon e fui pras ruas do Rio tocar. Saía sozinho, colocava um chapéu de abas caidas, estendia um plástico no chão, com um embornal aberto para as moedinhas, e espalhava livros de filosofia védica.Não vendia os livros, era divulgação, alguns caras enturmavam e ficavam lendo enquanto eu lascava o fole.Nada era premeditado nem seguia uma orientação ideológica definida.Acho que acontece com a maioria dos músicos ; um dia enjoam do esquemão da naite, piram, e vão para as ruas.

A escolha do instrumento, foi casual e prática. Não dava pra sair com um piano debaixo do braço, e violão tem o som fraco, precisa de amplificador.

Nunca fui perseguido ou expulso de nenhum lugar. Certa vez, montei minha “tenda” na estação dos bondes de Santa Tereza, e fui alertado que o dono do bar implicava com quem tentasse parar por ali. O sujeito, que falava portunhol e aparentava meia idade, veio se aproximando devagarinho, sentou perto de mim, e perguntou se eu queria tocar dentro do bar dele no final de semana, logo eu que tava fugindo do esquemão...

Minha aparência de retirante, que ta indo à luta, devia impressionar.

Alguns motoristas quando me viam no ponto, deixavam eu entrar pela porta da frente sem pagar. Músicos de rua, pelo menos dessa época, eram queridos e respeitados pelos passantes.

Meu itinerário era improvisado, e o roteiro musical, idem. Eu me divertia vendo a cara de espanto da galera, quando ouvia, além do Gonzagão, Beatles, MPB, e um “Bolero” estilizado para “xote de Ravel”, que o cabra tinha a irresponsável coragem de mandar.

Cheguei a ser filmado, e nalguma parte do globo, a asa branca deve estar batendo asas do Intermezzo vermelhinho.

Minha maior emoção foi na Praça Saens Pena. Uma senhora de cabelos grisalhos e um impressionante ar de dignidade, ficou me olhando, olhando, e aí perguntou se eu sabia tocar “Saudades de Ouro Preto”.

No final da execução, ela chorava de maneira discreta, fiquei sem saber o que fazer, minha timidez não gosta de chamar muito a atenção. Ela agradeceu, afagou minha cabeça, e foi embora. Não faço a menor idéia de qual fio foi puxado daquele carretel de linhas sensíveis.

Ainda vejo aquela cabecinha grisalha, descendo as escadas rolantes do metrô , até desaparecer no subsolo, como se fôsse o fole do acordeon quando fecha, ao encerrar candidamente uma canção.

Luiz Castello.

3 comentários:

  1. Quem estiver com dificuldades para postar seu comentário, eu recomendo o seguinte:

    1. Depois de escrever, clique na janelinha "comentar como:" verifique as opções, e em último caso, escolha postar como "anônimo".
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    Esses procedimentos tem dado certo.

    Beijo fraterno do Castello.

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  2. Luiz,
    Seu blog está cada vez mais interessante. Vídeos, textos, dicas... todos se parecem realmente com você. Também, se fosse assim, não seria seu!
    Em tempo: já tentei vários contatos telefônicos. Em vão.
    Bjs.
    Rosana.

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  3. Querida Rosana.
    Que legal receber sua visita.
    O objetivo é exatamente criar opções de lazer e informação,relacionados à vida-consciencia.
    "Mens sana in corpore sano".E voce tem tudo a ver com essa proposta.
    O blog é nosso.
    Meu beijo fraterno.
    Luiz Castello.

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